quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Por que erramos os "porquês"?



Nos trabalhos de revisão que faço, é muito comum eu ver, mesmo um autor experiente, usar “porque” em lugar de “por que”. Havendo quatro formas de escrever, é comum que haja confusão e uso trocado. Mas há regras claras e precisas para uso de cada um, e dificilmente eu vejo erros diferentes desse: “porque” no lugar de “por que”.

E tenho uma teoria sobre o porquê disso.

A pessoa não lembra as regras e parte para o resumo, sem ir a fundo nos usos de cada caso. Na maioria dos cursos, e até mesmo nos sites de gramática, o resumo que aparece é assim:

Por que = Usado no início das perguntas.
Por quê? = Usado no fim das perguntas.
Porque = Usado nas respostas.
O porquê = Usado como um substantivo.

O grande vilão está em dizer que “porque” é usado nas respostas. Isso leva a pessoa a associar que, se não há ponto de interrogação, então não é pergunta, e deve-se usar “porque”. Mas vejam esse exemplo:

Eu não entendo por que você não gosta de mim.
Eu não entendo porque você não gosta de mim.

Na primeira frase, o significado é: “Eu não entendo por qual razão você não gosta de mim.”

Na segunda, entenda-se: “Eu não entendo, pois você não gosta de mim.” Não faz sentido, né?

Vejam como a falta da interrogação pode induzir ao erro. Para quem entende inglês, eu sugiro identificar nesse idioma se a palavra usada seria “why” ou “because”. Por haver, na língua inglesa, uma diferença fonética entre os dois termos, os falantes desse idioma não têm dificuldades de identificar quando usar um e quando usar o outro.

Fica fácil ver que se você usa “why”, deve traduzir para “por que” (ou “por quê” se for no final da frase). E, obviamente, se usa “because”, então a tradução é “porque” (esse apenas sem acento).

Além disso, há outro caso em que se usa “por que”. É quando introduz uma oração subordinada e pode ser substituído por “pelo qual”, “pelos quais”, “pela qual” ou “pelas quais”.

Se você está com pressa e precisa de um resumo, melhor ignorar onde cada um é usado e identificar que termo poderia substituí-lo. Isso evita a confusão causada por achar que “porque” é usado quando há ponto de interrogação no fim da frase.
Assim, a fórmula que proponho como resumo da matéria é:

Por que
pode ser substituído por “por qual razão” (seja numa afirmação ou numa interrogação); ou
pode ser substituído por “pelo qual”, “pelos quais”, “pela qual”, “pelas quais”;

Por quê
também pode ser substituído por “por qual razão”, mas no fim da frase;

Porque
pode ser substituído por “pois”;

Porquê
é um substantivo, o único que aceita um artigo como em “o porquê” ou “os porquês” e pode ser substituído por “motivo”.


Exemplos:

Por que fez isso comigo? Por qual razão fez isso comigo? (com interrogação)

É inexplicável por que ele viajou agora. É inexplicável por qual razão ele viajou agora. (Sem interrogação.)

Vou te explicar a razão por que vim. Vou te explicar a razão pela qual vim. (Atenção: “a razão” pode ser omitida, ficando subentendida. Vou te explicar por que vim.)

Você está bravo assim por quê? Você está bravo assim por qual razão? (No final da frase.)

Tirei férias porque estava cansado. Tirei férias, pois estava cansado. (Atenção: ao substituir por “pois” é preciso acrescentar a vírgula.)

Explique-me o porquê dessa burocracia toda. Explique-me o motivo dessa burocracia toda. (Substantivo.)

Parece que o resumo ficou grande, mas assim você evita muitos erros.


Espero ter ajudado.