Corrigir redações permite que eu observe os erros mais comuns que os alunos cometem e que são inadmissíveis num exame. Pretendo começar uma série de postagens que evidenciam esses erros para que os alunos o evitem. Não vou falar de coisas banais, como erros ortográficos ou vícios comuns de linguagem. Pretendo evidenciar falhas que são pouco conhecidas e discutidas, mas que podem prejudicar o candidato na hora da prova.
O primeiro desses casos é o uso das aspas. Você sabe para que ela pode ser usada? E em que casos ela é aceitável num texto expositivo-argumentativo, isto é, numa dissertação, que é o gênero mais cobrado nos exames de admissão?
As aspas podem ser usadas nos seguintes casos:
IRONIA
Caso que jamais deve ser usado num vestibular ou concurso. É quando você diz uma coisa querendo dizer o contrário. A política de inclusão social daquele governo era “sensacional.” Lembre-se de que a dissertação é um texto técnico e sua linguagem é conotativa, portanto, uma ironia, que é uma figura de estilo típica de textos literários, não é adequada.
NEOLOGISMOS, GÍRIAS OU REGIONALISMOS
Use-as com cuidado, de preferência se a expressão não for criação ou fala do próprio candidato. No mundo dos “gamers”, um novato é chamado de “newbie.” Perceba que aqui os termos têm a função de explicar ao leitor os significados das gírias, portanto elas são aceitáveis, desde que entre aspas.
CITAÇÕES
Use com tranquilidade, aqui não tem como errar. Sempre que citar uma fala, um slogan, um lema, uma música, use as aspas se a transcrição for literal. Mas não as use se seu discurso for indireto. Vejamos os dois casos. “A imaginação é mais importante que o conhecimento”, disse Albert Einstein. Ora, se a citação transcreve palavra por palavra como foi dito por Einstein, então deve estar entre aspas. Paulo Freire já nos alertava que, mais do que transmitir conhecimentos, a educação deveria criar possibilidades para sua construção. Aqui o candidato cita, com suas próprias palavras, o que disse o autor da ideia, portanto não se deve usar aspas.
TÍTULOS (DE OBRAS)
Sempre que citar um livro, uma música, um filme, enfim, um trabalho que tenha um nome, essa obra deve aparecer entre aspas. A estátua “Davi”, de Michelângelo, é uma dos mais belos exemplos de perfeição artística.
MARCAS DE ORALIDADE E PESSOALIDADE
Esse é um caso que tenho visto com frequência em redações e o principal motivo de eu ter criado este artigo. As marcas de oralidade e pessoalidade são condenáveis numa dissertação. Esse gênero pede um texto impessoal, portanto é inadmissível que o aluno use frases como: Se você se distrai, pode sofrer um acidente. Numa conversa, ou seja, na linguagem falada, o uso de “você” é perfeitamente normal e o interlocutor sabe que essa palavra significa “alguém”. Mas numa redação esse recurso não pode ser usado. Em lugar disso, deve-se escrever algo como: Quando o indivíduo se distrai, pode sofrer um acidente. No entanto é frequente que o aluno use as aspas para tentar mascarar algumas dessas marcas, tentando fazê-las se passar por neologismos, gírias ou regionalismos. Duplo erro: o examinador saberá ver a diferença e a redação perderá pontos pelo uso indevido das aspas e das marcas de oralidade ou pessoalidade. Segundo Nietzsche, as pessoas estão cada vez mais “virando de costas”, ou seja, ignorando o mundo real para defender sua verdade absoluta. Nesse exemplo, o autor mencionado não usou essas palavras, portanto não é uma citação. O aluno tentou usar suas próprias palavras para resumir a ideia de uma forma mais acessível, isto é, usou uma expressão popular que pode ser entendida como uma gíria ou regionalismo. O problema é que essa expressão é do autor da redação, não de Nietzsche. Nisso, dois erros foram cometidos: a marca de oralidade e o uso indevido das aspas. O que mais entristece o professor é ver que o trecho poderia simplesmente ser suprimido, já que o aluno explica depois o que quis dizer: Segundo Nietzsche, as pessoas estão cada vez mais ignorando o mundo real para defender sua verdade absoluta.
Resumindo…
- Ironia – Nunca use numa dissertação, com ou sem aspas.
- Neologismos, gírias ou regionalismos – Use, com aspas, quando não for invenção sua.
- Citações – Use aspas se for reproduzida literalmente, não as use se for adaptada (com suas palavras).
- Títulos (de obras) – Sempre use aspas para mencionar o nome de uma obra.
- Marcas de oralidade e pessoalidade – Não as use, com ou sem aspas.
Só lembrando que essas orientações se aplicam aos textos dissertativos, que são textos técnicos, impessoais. Se a prova lhe pedir uma crônica ou um conto, as regras são outras, pois esses gêneros são menos “engessados”, o que dá maior liberdade criativa ao candidato.
Uma boa redação para você.